A ação litúrgica na Igreja Primitiva

CAPELA DE SANTO ANANIAS – DAMASCO (SEC I)

“Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós mesmos” (Jo 6, 53).

A Missa foi instituída por Nosso Senhor Jesus Cristo, na última quinta-feira de sua vida mortal (conf. Mt 26,28; Mc 14,24; Lc 22,20; 1Cor 11,25). Aparece entre os primeiros cristãos, inclusive é citada nos Atos dos Apóstolos: “No primeiro dia da semana, tendo-nos reunidos para a fração do pão…” (At 20,7). E Fazia parte do primeiro Catecismo cristão: “Reuni-vos no dia do Senhor para a fração do pão e agradecei, depois de haverdes confessado vossos pecados, para que vosso sacrifício seja puro.” (Didaqué, XIV,1).

O primeiro a usar a palavra Missa no sentido atual foi provavelmente Santo Ambrósio (+ 397) na epístola 20,4. Santo Agostinho (+ 430) escrevia: “Eis que após o sermão se faz a missa (= despedida) dos catecúmenos; ficarão apenas os fiéis batizados” (serm. 49,8).

A Eucaristia foi sempre, sem sombra de dúvida, desde os tempos primitivos, a celebração litúrgica por excelência e o centro da vida cristã, mas, para compreendermos melhor o surgimento e a evolução da Liturgia Cristã, temos que partir do ponto de que Jesus e seus seguidores praticavam a religião judaica, eles participavam das celebrações litúrgicas (templo, sinagoga, oração e festas). Jesus era um homem muito piedoso, assim como seus seguidores (discípulos, posteriormente apóstolos) e participavam assiduamente da religião de seu povo. Jesus e os apóstolos não vieram romper com a liturgia antiga, pelo contrário, vieram dar pleno cumprimento (Mt 5,17), aperfeiçoá-la. Assim sendo, deu uma nova orientação aos ritos judaicos já existentes. Portanto, a nossa liturgia cristã é uma continuidade da liturgia hebraica. O nosso referencial é Jesus de Nazaré. A partir do mistério de Cristo, aconteceu uma cristianização dos elementos ritualizados herdados, surgindo daí a liturgia cristã.

Sendo assim, o culto da igreja primitiva inspirou-se na liturgia das sinagogas. Nestas, após uma invocação inicial, eram recitados o “Shema” (credo baseado em Dt 6, 4-9 e outros textos) e o “Berakah” (conjunto de orações). A seguir, eram lidas passagens do Pentateuco e dos Profetas, seguindo-se uma exposição do texto. Também eram cantados salmos, especialmente o “Hallel” (113-118). Seguindo esse modelo, o culto cristão original foi extremamente simples, constando de orações, cânticos, leituras do Antigo Testamento e das “memórias dos apóstolos”, exortações pelo celebrante, coletas em prol dos carentes e celebração dos sacramentos, em especial a “Ceia do Senhor, ou Eucaristia”.

Para compreendermos melhor, já no segundo século, temos um valioso relato na obra “Apologia I”, de São Justino Mártir nascido em 103, filósofo pagão convertido, tornado sacerdote e martirizado:

– Nessa época, já haviam surgido fórmulas para elementos da liturgia, como as belas orações eucarísticas existentes no primeiro Catecismo, a “Didaquê”. Com o passar do tempo, a liturgia foi se tornando cada vez mais padronizada, sendo usada com pequenas variações em todas as igrejas. O culto tinha duas partes distintas: “a Liturgia da Palavra, aberta a todos, e a Liturgia do Eucarística, somente para os batizados”.
– No dia dito do sol (domingo) reúnem-se em um mesmo lugar todos os cristãos, os que residem nas cidades e os que residem no campo.
– O leitor lê trechos tirados das memórias dos Apóstolos (Novo Testamento) e dos livros dos Profetas (Antigo Testamento).
– Terminada a leitura, aquele que preside toma a palavra para explicar aos presentes o que foi lido e exortá-los a pôr em prática tão belos ensinamentos (homilia).
– Em seguida, levantamo-nos todos e dirigimos a Deus orações e súplicas (súplica insistente ou ecteni, após o Evangelho).
– Suspendendo as orações, abraçamo-nos uns aos outros (Ósculo da paz).
– Depois levam àquele que preside a reunião dos irmãos em Cristo, pão e um cálice contendo vinho, misturado com água (Procissão do ofertório).
– O Presidente toma o pão e o cálice, louva e glorifica o Pai do universo em nome de seu Filho e Espírito Santo; dirige-lhe abundantes ações de graças por ter-se dignado dar-nos estes dons (Anáfora).
– Terminada esta ação de graças (Eucaristia) todos os presentes exclamam: Amém.
– Depois os ministros que chamamos diáconos distribuem a todos os presentes o pão da Eucaristia e o vinho misturado com água (Comunhão). Estes mesmos diáconos levam aos ausentes sua parte do pão e do vinho eucarísticos.
– Por fim, os ricos socorrem os indigentes (Coletas).

 

 

Em breve, mais artigos sobre a evolução da Liturgia através dos séculos.

Sergio Luiz Matias – Consagrado da Comunidade Fanuel, Rosto de Deus.