No principio dos seus Exercícios Espirituais, S. Inácio de Loiola define com poucas palavras o dever do homem para com o seu Criador. “O homem foi criado para louvar a Deus, Nosso Senhor, prestar-Lhe reverência e servi-Lo e, fazendo isto, salvar a sua alma. A s outras coisas na terra foram criadas por causa do homem e para o ajudar na consecução do fim, para o qual foi criado”.
Estas palavras são uma introdução adequada à Liturgia sacra. Pois o homem, criatura de Deus que é, depende dele completamente; a sua dependência deve-a reconhecer e manifestar. Pela reverência interior reconhece a soberania de Deus sobre a sua alma, fazendo, por exemplo, os atos de fé, esperança e caridade; é o culto interior. Pelo louvor e serviço manifesta os sentimentos de sujeição por meio de sinais sensíveis; é o culto exterior. O homem não está sozinho na terra; há “outras coisas, criadas por causa dele.”
Estas outras coisas são, em primeiro lugar, os outros homens, vivos e mortos; em segundo lugar as criaturas irracionais, vivas e inanimadas. Devem auxiliá-lo na consecução do seu fim; devem, portanto, em ação comum com ele, servir a divina Majestade. Este serviço comum de todas as criaturas é serviço de Deus, é Liturgia, na acepção mais lata, embora imprópria, porquanto inclui todos os deveres do homem. Nesta disciplina, porém, tornamos a palavra Liturgia no seu sentido próprio, significando um dever especial, o culto direto do Criador, cujos atos abrangemos com o nome de Virtude de Religião.
O Sujeito da Liturgia
O primeiro sujeito da Liturgia é Jesus Cristo. É o ministro principal; sua morte na cruz foi o sacrifício, que devia conciliar a humanidade pecadora com Deus, e Ele mesmo foi o sacerdote, o liturgo, que se ofereceu a seu Pai celeste.
Este sacerdócio ainda continua no céu; pois “sendo Jesus eterno, tem um sacerdócio eterno.” (Heb 7, 24.) Na terra Ele é o liturgo principal na missa. Pois o concílio tridentino (sessão 22, c. I) declara: “E’ o mesmo que agora se sacrifica pelo ministério dos sacerdotes e que se ofereceu. na cruz.”
Ele é o liturgo principal na administração dos sacramentos. Célebres são as palavras de S. Agostinho (Tract. 6 in Jo n. 7) : “Se Pedro batiza, é Este (Cristo) que batiza; se Paulo batiza, é Este que batiza; se Judas batiza, é Este que batiza.” O mesmo vale dos outros sacramentos.
Jesus Cristo é o liturgo principal nos vários atos do culto, na oração pública, nos sacramentais, ainda que não tenham sido instituídos por Ele, Instituiu-os a Igreja, autorizada por Ele e unida a Ele como à Cabeça.
O liturgo secundário é o sacerdote, que recebe o poder no sacramento da ordem. Atua não só em nome de Jesus Cristo, mas também em nome da Igreja, como seu representante legitimo. Suas orações litúrgicas têm por isso valor independente da sua santidade pessoal, baseado nos méritos da Igreja, que “é amada por Cristo.” (Ef 5, 25.)
Liturgo secundário, ao menos de alguma maneira, é cada um dos fiéis, incorporados pelo caráter batismal em Jesus Cristo, único Sacerdote. São “sacerdotes (S. Thom. III, 63, 5: Character sacramentalis est quaedam participatio sacerdotii Christi in fidelibus. Jürgensmeier, Der mystische Leib Christi, p. 289. Gatterer, Ann. lit. p. 8) de Deus e de Cristo.” (Apoc 20, 6.) O fiel, portanto, não só assiste à missa, mas oferece-a. Não pode chamar a vítima do céu como o sacerdote, mas pode oferecer a Deus a vítima, tornada presente, como o seu sacrifício, em união com o sacerdote sacrificador, em dependência dele e unido a toda a Igreja, Corpo Místico de Jesus Cristo. Pois o sacrifício eucarístico é o sacrifício de todo o Corpo Místico de Jesus.
“Toda , a reunião dos santos é o sacrifício universal oferecido a Deus pelo sumo Sacerdote. Também Ele se ofereceu por nós, na paixão, para que fôssemos o corpo de Cabeça tão digna… Este é o sacrifício dos cristãos: muitos um corpo em Cristo. E a Igreja repete esta verdade, muitas vezes pelo sacramento do altar, conhecido aos fiéis, onde é evidente que, na matéria que oferece, ela mesma é oferecida.” (S. Ag., De civ. Dei, 1. 10, c. 6.) Portanto o fiel cristão é sacerdote e vítima com Nosso Senhor.
Esta pode ser exercida:
Pela intenção implícita (habitual), em virtude do fato da incorporação no Corpo Místico, ou por outra, de pertencer à Igreja católica; é isto o suficiente para tomar, parte de alguma maneira no fruto da missa.
Pela intenção explícita passada que, uma vez feita e não revogada (chamada virtual), é eficaz para apropriar à alma o fruto de uma ou mais missas, p. e., de um dia inteiro.
Pela intenção atual, a mais frutuosa, assistindo realmente ao santo sacrifício. Esta assistência, e por conseguinte também o fruto, difere conforme o grau da atividade espiritual ou corporal de cada um. Quanto maior for a atenção e devoção, tanto maior será o I rufo. Se alguém contribui para à celebração da missa, cantando ou desempenhando qualquer função, p. ex., de ajudante, ministro, lerá aumento do fruto correspondente ao grau do seu ofício e trabalho. (Coelho I, p. 162.) Maior ainda é o fruto especial que compete àquela pessoa, por quem é oferecido o santo sacrifício; e o fruto especialíssimo, que pertence ao celebrante.
Fonte: Curso de Liturgia – 2ª Edição – Pe. João Batista Reus, S. J. – Ed Vozes Limitada – Petrópolis – Rj 1944