O Amor de Deus nas escrituras

“Pois Deus amou tanto o mundo que entregou o seu Filho único, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16)

É com esta afirmação de São João que buscamos entender o que as Sagradas Escrituras expressam sobre o Amor de Deus.

A palavra amor está presente na expressão bíblica de Gênesis ao Apocalipse. É importante ter clareza sobre essa expressão, que como vemos tem sofrido deturpações ao longo do tempo, afastando assim o termo da sua expressão original. Quando trabalhamos no cristianismo o amor, devemos entender que estamos falando da essência da fé cristã, pois “Deus é Amor” (1Jo 1,8). E como entender a dinâmica do Amor, quando se olha para a história de um Deus que assume a fragilidade humana e padece dolorosamente num madeiro da cruz? Antes é necessário refletir o amor de Deus desde o Antigo Testamento, para já fugir da possibilidade de imaginar dois conceitos distintos sobre o Amor, ou seja, uma interpretação para o Antigo Testamento e, outra para o Novo Testamento.

Em passagens do Antigo Testamento, a expressão ‘amor de Deus’ significa a relação não geral, mas precisamente especial de Deus com o seu povo de Israel, isso em larga escala restrito aos escritos proféticos. Porque Deus ama Israel, ele o elegeu (cf. Dt 4, 37; 7,7s.; 13;10,15), permanece-lhe fiel mesmo no caso de toda infidelidade (cf. Os 1-3; 2,2.20.23ss; 3,1ss. 6-13) com ‘amor fraterno’ (cf. Jr 31,3), volta-se para ele como pai (cf. Jr 31,9.20; Os 11) e como mãe (cf. Is 49,14s) e por isso o salvará (cf. Is 41,8ss; 43,1-4; 44,1s; 54,5ss; 60,10; 63,7ss).

Seria um erro grave, imaginar que o Amor de Deus por Israel, pelo seu povo, fosse algo expresso somente no Novo Testamento, erro que manifestaria mais uma ignorância sobre o texto sagrado.

O Antigo Testamento utiliza o termo hebraico ‘ahab’ (reciprocidade, amor desinteressado) para expressar o contexto do amor de Deus. A relação de amor deve ser sempre uma relação de reciprocidade: Deus ama Israel e Israel corresponde a este amor, amando a Deus de todo o coração e com todas as suas forças (cf. Dt 6,5).

O livro do Deuteronômio é o primeiro do Antigo Testamento a incorporar a ideia do amor de forma sistemática em seu pensamento, e continua sendo o livro do Antigo Testamento em que a concepção possui o lugar mais amplo, pois é um contraste com Oséias e com outros profetas que abordam a ideia, pois, o conceito de amor no Deuteronômio apresenta-se frio e sem paixão. O amor de Iahweh por Israel é uma continuação do seu amor aos patriarcas (Dt 4,37; 7,8;10,15).

É importante notar a ação do amor de Deus sempre presente na sua relação com o homem. Deus não faz nada além de amar, já que essa é a sua definição por excelência e para o homem livre, o seu agir é sempre resposta de amor ao amor de Deus. Assim, o primeiro mandamento é cumprido no amor, Israel tem que amar com todo o seu coração, com todo o seu ser e com toda a sua força. Não se separa o Amor da Lei.

No Novo Testamento, a expressão em grego encontra as variantes eros, philia e agape  para designar o amor. É a partir das distinções presentes nesta palavra que no futuro a crise de sentido se manifestará. Eros significa a paixão de desejo sexual e não aparece no Novo Testamento.

A experiência do amor de Deus manifestada no Novo Testamento não pode ser separada do amor ao próximo (1Jo 4,20).

Assim, a expressão da caridade se tornará a forma perfeita de amar (1Cor 13,13). O cumprimento da lei é o amor dedicado a Deus e ao próximo: é assim que se percebe a consonância entre o Antigo e o Novo Testamento. Amar a Deus e ao próximo não é uma relação de consequência, mas uma relação de igual para igual: ama o próximo quem ama a Deus e quem ama a Deus ama o próximo.

 

Sergio Luiz Barbosa

Consagrado da Comunidade Fanuel, Rosto de Deus.