Onde está o Calvário?

Há coisas belíssimas na vida que para que nos esqueçamos delas, como por exemplo o amor de uma mãe, por isso, guardamos com carinho a sua fotografia. Os monumentos, pontes, rodovias, edifícios com o nome de pessoas ilustres e importantes, assim como os bustos e estátuas nas praças, tudo para relembrar e mostrar a importância destas pessoas à nós. Diante de tudo isso, podemos dizer que a maior de todas as as bênçãos que já aconteceu na história foi a encarnação do Filho de Deus. Sua vida, mais que todas as outras, é bela, rica e profunda para ser esquecida. Por isso, prezamos a divindade de suas palavras por meio das Sagradas Escrituras, e a caridade de suas obras por meio de nossas ações diárias. Infelizmente, algumas pessoas se limitam a lembrar apenas as palavras e as obras de nosso Divino Redentor; por mais importantes que sejam, não são estas as suas realizações mais grandiosas. O ato mais sublime da biografia de Cristo foi a sua morte.

Se a morte foi o momento supremo para o qual Cristo viveu, foi também o modo com que desejou ser lembrado. Ele não solicitou aos homens que transcrevessem suas palavras em uma Escritura. Não pediu que sua generosidade para com os pobres fosse registrada na História. Mas pediu que a humanidade se lembrasse de sua morte. E para que sua memória não fosse abandonada ao acaso das narrativas humanas, Ele mesmo instituiu a maneira precisa de recordá-la.

Tal Memorial foi instituído na noite anterior à sua morte, e desde então foi chamado “A Última Ceia”. Tomando o pão em suas mãos, Jesus disse: “Este é o meu Corpo, que será entregue por vós”, ou seja, entregue à morte. Então, com o cálice nas mãos, disse: “Este é o Sangue da Nova Aliança, que será derramado por vós e por muitos, para a remissão dos pecados” (Mt 26, 28).

Assim, em um símbolo incruento da divisão do Sangue e do Corpo, pela consagração separada do pão e do vinho, Cristo ofereceu-se à morte diante de Deus e dos homens, e instituiu uma representação sacramental daquilo que aconteceria no dia seguinte, às três da tarde. Ele se ofereceu como vítima a ser imolada, para que os homens se recordassem que “não há amor maior do que o daquele que dá a vida pelos seus amigos” (Jo 15, 13). Em seguida deu o divino Mandamento à Igreja: “Fazei isto em memória de Mim”.

A Igreja fundada por Cristo preservou não apenas as Palavras ditas por Ele, e/ou as maravilhas que operou; também e sobretudo levou-o a sério quando disse: “Fazei isso em memória de Mim”. E a ação pela qual se atualiza a sua morte na Cruz é o Sacrifício da Missa, memorial daquilo que Ele realizou na Última Ceia como prefiguração de sua Paixão.

Por isso é que a Santa Missa é para nós o ato mais importante do culto cristão, o ápice de nossa fé. Na Igreja Católica, o Altar –, não a pregação do púlpito, ou o canto do coral, ou o som do órgão –, é o centro da cerimônia, pois ali é atualizado o memorial da Paixão de Nosso Senhor. Seu valor não depende de quem celebra ou assiste; depende d’Ele, que é o supremo Sacerdote e Vítima, Jesus Cristo. A Ele somos unidos, apesar da nossa insignificância. Em certo sentido, por um momento, perdemos a nossa individualidade; nosso intelecto e nossa vontade, nosso coração e nossa alma, nosso corpo e nosso sangue unem-se tão intimamente a Cristo que o Pai celeste não olha principalmente as nossas imperfeições, mas antes vê em em nós seu Filho amado, em quem se compraz. A Missa é, por tudo isso, o maior evento na história da humanidade; o único ato sagrado que protege o mundo pecador da ira de Deus, porque sustenta a Cruz entre o Céu e a Terra, renovando aquele momento decisivo em que nossa triste e trágica jornada humana repentinamente tomou o rumo da plenitude de uma vida sobrenatural.

Cada palavra é uma parte da Missa:
A primeira palavra, “Perdoa-os”, é o Confíteor (‘Confesso a Deus…’); a segunda palavra, “Hoje estarás comigo no Paraíso”, é o Ofertório; a terceira palavra, “Eis aí tua Mãe”, é o Santo; a quarta palavra, “Por que me abandonastes?”, é a Consagração; a quinta palavra, “Tenho sede”, é a Comunhão; a sexta palavra, “Tudo está consumado”, é o Ite, Missa Est (ou Rito de despedida); e a sétima palavra, “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito” é o Evangelho final.

Imaginemos, pois, Cristo, o Sumo Sacerdote, deixando a Sacristia do Céu pelo Altar do Calvário. Ele já se revestiu da nossa natureza humana, tomou o manípulo do nosso sofrimento, a estola do sacerdócio, a casula da Cruz. O Calvário é sua Catedral; a rocha do Calvário é a pedra do Altar; o sol poente é a lâmpada do santuário; Maria e João são as imagens vivas dos altares laterais; a Hóstia é o Corpo de Jesus; o Vinho é seu Sangue. Ele, em pé, é o Sacerdote; prostrado, é a Vítima (Fulton Sheen).

Vamos à Santa Missa?

Sergio Luiz Barbosa – Consagrado Comunidade Fanuel

BIBLIOGRAFIA
SHEEN, Fulton John. O Calvário e a Missa. São Paulo: Molokai, 2016, pp. 13-19