São Judas e os dias atuais

sandro outubro1

 

 

Hoje a Igreja comemora o dia dos Apóstolos São Simão e São Judas e, dentre os dois, o segundo tornou-se mais popular, pelo menos no Brasil. Conhecido como grande intercessor por causas impossíveis, creio que a longa trajetória do povo brasileiro, na pobreza e nas decepções de uma sociedade mal governada, acabou por tornar São Judas Apóstolo tão querido e procurado.

 

É uma grande pena que este Apóstolo de Nosso Senhor Jesus Cristo seja lembrado apenas por esta razão de fé rasa, sim, digo de fé rasa porque a vida deste grande santo deveria ser melhor considerada como exemplo a ser seguido no discipulado e no apostolado cristão, e não apenas como um “resolvedor” de problemas sem nada mais a oferecer.

 

São Judas é infelizmente ignorado em sua grandeza como Apóstolo a tal ponto de, a grande maioria de seus devotos, se quer saber que ele é um dos escritores inspirados do Novo Testamento. O último livro na ordem do AT (antes do Apocalipse) é de autoria de São Judas, e lá encontramos uma doutrina muito sólida para uma vida de santidade.

 

Nossos dias estão conturbados pelo reino da confusão moral, dias em que a humanidade cada vez mais se arrasta e escorrega em uma vida laxa e desinteressada, principalmente no mundo ocidental, que foi o berço da fé cristã. No Oriente, pelo menos no Oriente Médio, levanta-se o reino do terror, que avança sobre uma Europa paralisada na fé e que se vê como presa fácil para os maometanos; já no Oriente mais extremo ainda o grande desafio da evangelização primeira com povos e culturas apegados a práticas religiosas sem o conhecimento da salvação, cheios de misticismo, crendices e lendas, um terreno a ser conquistado ainda. O antigo continente africano permanece sendo terra de missão com tribalismos primitivos não civilizados que, mesmo onde deixou a sua forma original bruta, está, porém presente nas cruentas guerras e revoluções cheias de separatismos, cheias de ódio e pobreza, como um terreno fértil para facções islâmicas cheias de ódio.

 

As Américas seriam a esperança cristã, mas resolveram abandonar os princípios da fé e da moral, conservam a forma aparente da religião, mas na prática desfazem do que professam tornando-se cada vez mais crescente o número de escolas e instituições que deixaram de ensinar a sã doutrina. A organização social no “continente da esperança” tornou-se inimiga da Igreja e da família e a vida passou a ser entendida apenas como a busca de prazer cultural, financeiro e sexual, de forma que as pessoas são guiadas apenas pela satisfação dos desejos de sua natureza, dando a isto o nome de felicidade. Vive-se uma vida sem perspectivas maiores e sem grandeza de alma, morreu o sonho de um mundo que honre a Deus e eleve o ser humano para a sua dimensão de eternidade.

 

Sei que ao fazer esta descrição posso parecer pessimista, mas fui sucinto ao extremo e usei cores muito brandas, porque a realidade é muitíssimo pior. Mas escrevo sobre isto no dia de São Judas em consideração do que ele mesmo escreveu em sua brevíssima carta de apenas um capítulo e 25 versículos, contida no Novo Testamento.

 

O tema de São Judas foram os falsos mestres, ele denunciou sem medo o grande perigo que eles traziam para dentro da Igreja. No olhar do Apóstolo a comunidade dos cristãos é uma sociedade dentro da sociedade e deve buscar manter-se limpa e sem mancha, mas está sendo assediada por pessoas que desejam destruí-la em sua base infiltrando-se e disseminando modos de viver que não concordam com os ensinamentos do Senhor Jesus.

 

São Judas apresenta o motivo de sua carta no versículo 3, quando diz: “Então senti que era necessário escrever agora para animá-los a combater a favor da fé que, uma vez por todas, Deus deu ao seu povo.” O motivo inspirado do Apóstolo é animar os bons cristãos ao combate, o que demonstra que se está em uma guerra, mas é uma guerra contra a fé definitiva que Deus nos deu em Jesus Cristo. É muito importante notarmos que esta fé dada uma vez por todas define o modo de viver que agrada a Deus e que ela não se resume a um modo de crer em algum “deus” e de cultuá-lo, mas se fundamenta na revelação do Senhor Jesus Cristo como Filho de Deus e implica, para além de atos de culto, em uma maneira moral de viver e organizar a sociedade, por esta razão há uma guerra, porque a sociedade dos cristãos tende a avançar por meio da evangelização, moldando o mundo numa forma em que somente Nosso Senhor Jesus Cristo seja honrado como Deus no mistério da Santíssima Trindade, e que somente a Igreja Católica esteja à testa da orientação do culto a Deus e da vida moral. Claro que esta missão cristã é rebatida desde o tempo dos Apóstolos por um mundo resistente e impenitente, orientado por gente que se beneficia deste estado de pecado e idolatria; lembremo-nos do que aconteceu em Filipos (cf. At 16, 16-24) quando São Paulo libertou uma mulher de um espírito de adivinhação que servia a seus donos e os enriquecia, ela fazia parte de uma estrutura religiosa pecaminosa que se amoldava à sociedade imoral romana. O Apóstolo São Paulo não se acomodou no testemunho daquela mulher sobre seu ministério porque Jesus não era mais um deus num panteão de ídolos. Aconteceu que ao romper severamente com isto a ordem pública deveria ser alterada e os beneficiários do culto pagão trataram de por Paulo e Silas na cadeia porque sabiam que o Senhor Jesus Cristo e Sua Igreja iriam mudar aquela sociedade depravada como eles mesmos atestam em suas palavras nos versos 20 e 21: “Estes homens são judeus e estão provocando desordem na nossa cidade. Estão ensinando costumes que são contra a nossa lei. Nós, que somos romanos, não podemos aceitar esses costumes.

 

São Judas demonstra com muita clareza que os inimigos da fé e da sociedade cristã estão usando de uma estratégia sórdida muito pior do que atacar a Igreja por fora, mas infiltrando-se nela disseminam ensinamentos e maneira de viver errados que levam à perdição eterna. Este mal, que trabalha como mistério de iniquidade, desde a era primitiva cristã, foi também denunciado como tendo se fortalecido e estando em avançado estágio em nossa época pelo Santo Padre o Papa São Pio X em sua encíclica de 08 de setembro de 1907: PASCENDI DOMINICI GREGIS, na qual denuncia e ensina como livrar-se das insídias dos modernistas que em nossos dias atuais se chamam progressistas.

 

Na carta do Apóstolo São Judas está muito bem enumerada a ordem de intenções e males que estes inimigos de Deus e da Igreja se aplicam a praticar sorrateiramente infiltrados (cf. Jd 1, 4):

 

  • “Eles torcem a mensagem a respeito da graça do nosso Deus a fim de arranjar uma desculpa para a sua vida imoral.” – Isto é evidentemente compreendido no sentido de que a Graça de Deus é considerada como uma misericórdia sem justiça, como um perdão e compreensão irrestritos em nome de um acolhimento do pecador que é tão amado por Deus que o aceita tal e qual sem impor-lhe um caminho de penitência e arrependimento. Uma graça barata, sem esforço nem mudança de vida onde Deus tanto quer esta pessoa consigo que não lhe faz nenhuma exigência e a mesma não pode ser julgada por ninguém, nem mesmo pela Igreja que deve pregar-lhe um Evangelho fácil, propor-lhe uma vida sem “pesos” doutrinários e morais, repito, tudo em nome do acolhimento.

 

  • E também rejeitam Jesus Cristo, o nosso único Mestre e Senhor.”- Os deturpadores da fé e da moral cristã não poderiam atingir seus objetivos se Nosso Senhor Jesus Cristo não for derrubado de Sua posição única de Deus e suficiente Salvador e Senhor, por esta razão, não podendo derrubá-Lo na realidade trabalham por fazê-lo nas consciências, apregoando cada vez mais a paridade entre a fé cristã e as crenças religiosas. Fazem de tudo para colocar o Senhor Jesus no nível de profetas, adivinhos e fundadores de credos pagãos e religiões primitivas e exuberantes. Para que não sejam apanhados em sua astúcia, colocam o Senhor Jesus no centro de um grupo de “mestres espirituais” e tentam convencer-nos que o ÚNICO Redentor seria como que um chefe dos demais. O panteísmo religioso e a mistura de crenças é um sinal visível da tentativa de destronar Nosso Senhor Jesus Cristo e assim por consequência derrubar a verdade absoluta de Seus ensinamentos, da fé e da moral cristã.

 

Esses dois pilares são o apoio destes inimigos da Igreja que se infiltraram há muito e trabalham arduamente contra Deus e contra os bons. As consequências deste trabalho são também enumeradas por São Judas quando diz:

 

  • Lembrem dos moradores de Sodoma, de Gomorra e das cidades vizinhas, que agiram como aqueles anjos e cometeram imoralidades e pecados sexuais. Eles sofreram o castigo do fogo eterno, o que é um aviso claro para todos. Do mesmo modo esses homens têm visões que os fazem pecar contra o próprio corpo deles.”(vs. 7-8a) – A imoralidade sexual está diretamente ligada a uma vida de falso cristianismo. O exemplo eterno do juízo divino sobre Sodoma e Gomorra é um alerta grave que está desconsiderado em nosso tempo, em que os atentados contra a família começaram lenta e suavemente colocando disputa e depois ódio entre o homem e a mulher, criando o machismo e depois o feminismo, tirando de cada um as vestes, o pensamento e o comportamento próprio de cada sexo, gerando a concorrência financeira entre os cônjuges e depois o divórcio, iludindo a todos que o adultério não existe e por isso foi arrancado das restrições civis e penais para depois ser também desconsiderado na religião de forma que a Igreja seja “obrigada” a aceitar a união de pessoas casadas com outros como um ato lícito e que deve ter cidadania no meio do povo de Deus, a ponto de muitos pretenderem até mesmo dar a estes o direito da Sagrada Comunhão Eucarística, não é de se admirar que a destruição dos valores familiares iria gerar o consentimento com pecados gravíssimos e publicamente nojentos como a fornicação, o incesto, a pedofilia, toda a sorte de promiscuidades e a sodomia, sim, este último que recebe este nome derivado de Sodoma, mas cuja definição foi abandonada e revestida de aparente normalidade, ao ser designada por pretenso avanço científico e psicológico de homossexualismo e homossexualidade. Na verdade, as Escrituras condenam esta inclinação perversa e esta prática abertamente, mas um cristianismo contaminado pelo laxismo e acomodado às exigências do mundo moderno se cala ou dissimula respostas genéricas, não por medo da perseguição e martírio, porque os bons e fiéis nunca conheceram este medo, nem por receio de perder fiéis, porque os fiéis não se perdem os que abandonam a Igreja são os infiéis, mas sim por acomodação às práticas imorais por causa do altíssimo nível de contaminação disseminada no interior da Igreja.

 

  • Desprezam a autoridade de Deus e insultam os gloriosos seres celestiais.” (v. 8b) – A baixa maneira de viver em seu próprio corpo é o sinal evidente de que o mundo vai de mal a pior em um caminho de impiedade e falta de temor, desdenhando da eternidade da vida e entregando-se ao amor ao dinheiro e aos prazeres, num caminho de consumismo cada vez mais crescente e despreocupação com o agir dos demônios, de tal forma que a maldade impetrada contra os cristãos chega ao assassinato e martírio público, sem nenhuma consideração das autoridades mundiais, que não pautam mais seu estado de governo na governança do bem e da moral revelada pelas Escrituras, e na medida em que o mundo anteriormente cristão se cala e se arruína, avançam os apóstatas e inimigos da Igreja em ações orquestradas e previstas para que a civilização cristã seja completamente erradicada e os homens vivam na terra um “paraíso” de prazeres sem Deus e sem regras no qual o desejo de cada um é seu mestre e sua verdade.

 

  • Com as suas vergonhosas bebedeiras, eles são como manchas de sujeira nas refeições de amizade que vocês realizam.” (v. 12) – Talvez este último efeito acusado por São Judas seja o mais assombroso na ousadia desta gente, mas ao mesmo tempo o mais inesperado. O avanço oculto e interno desses inimigos de Nosso Senhor Jesus Cristo, já na Igreja Primitiva, havia se infiltrado no culto cristão, que naquela época era celebrado dentro de uma refeição fraterna chamado de Ceia Ágape. Após tomarem a comida juntos e ouvirem a Palavra de Deus os batizados continuavam unidos no culto Eucarístico onde reatualizavam o sacrifício redentor de forma incruenta no pão e no vinho. Os inimigos ocultos estavam deturpando e manchando estes encontros sagrados e tentando mundanizá-los com práticas de outras ceias fraternas de agrupamentos mundanos. Terá em nossos dias também a Eucaristia sido maltratada e profanada em suas celebrações? Será este o sinal previsto por Daniel e relembrado pelo Senhor Jesus quando se referiam ao estabelecimento da abominação da desolação no lugar sagrado? (cf. Mt 24,15).

 

Pois bem, após acusar os intentos dos inimigos infiltrados e seus terríveis resultados, São Judas ainda aponta de que isto irá aumentar secretamente e voltar a manifestar-se com grande força no final dos tempos: “Mas vocês, meus amigos, lembrem do que foi profetizado pelos apóstolos do nosso Senhor Jesus Cristo. Eles disseram a vocês: ‘Quando chegarem os últimos tempos, aparecerão pessoas que vão zombar de vocês, pessoas que não querem saber de Deus e seguem os seus próprios desejos.’”(vs. 17-18)

A Palavra de Deus não nos deixa em dúvidas e nem sem orientação, o Espírito Santo inspirou ainda São Judas a orientar aos discípulos de Nosso Senhor Jesus Cristo dizendo: “Porém vocês, meus amigos, continuem a progredir na sua fé, que é a fé mais sagrada que existe. Orem guiados pelo Espírito Santo.E continuem vivendo no amor de Deus, esperando que o nosso Senhor Jesus Cristo, na sua misericórdia, dê a vocês a vida eterna.Tenham misericórdia dos que têm dúvidas; salvem outros, tirando-os do fogo; e para com outros mostrem misericórdia com medo, odiando até as roupas deles, manchadas pelos seus desejos pecaminosos.Deus pode evitar que vocês caiam e pode apresentá-los sem defeito e cheios de alegria na sua gloriosa presença.” (vs. 20-24).

 

Estas orientações do Espírito Santo merecem uma consideração detalhada, mas que em oportuna ocasião voltaremos a ela. Basta-nos agora contemplá-las e orar ao Senhor para que nos de um coração capaz de absorvê-las e de respeitá-las, o próprio Espírito Santo nos iluminará.

 

Com tudo isto podemos então notar que São Judas é realmente muito mais do que o santo das causas impossíveis e que, se seu número de devotos lessem sua carta, talvez a quantidade de incautos diminuiria e nosso País estaria em menor risco de perdição.

São Judas Apóstolo, rogai por nós.

 

Em Cristo

Sandro F. Peres