A Verdadeira Beleza

“Sou morena, mas sou bela, ó filhas de Jerusalém, como as tendas de Cedar, como os pavilhões de Salomão”. (Ct 1,5)

Quero compartilhar com você um entendimento incrível deste versículo de Cântico dos Cânticos, que muito me impressionou e creio ser de utilidade para toda boa alma que deseja crescer no conhecimento de Deus.

Pra começar, recordo que o livro poético do Cântico dos Cânticos é geralmente ignorado seja por pouca leitura que se faça do mesmo, seja pela leitura superficial e desatenta. São João da Cruz, o grande místico carmelita, e na sua estrada muitos outros desta magnífica ordem, foi quem o explorou um tanto mais e nos presenteou com belíssimos ensinamentos que devem ser conhecidos, mas enfim, este é um livro razoavelmente desconhecido dos leitores mais comuns e por isso alguns elementos de linguagem que nele aparecem são estranhos aos leitores e exigem particular consideração. Este é o caso das tendas de Cedar e dos Pavilhões de Salomão que aparecem neste verso.
Os poemas deste livro inspirado tratam de relações de amor entre um homem e uma mulher, aparentemente o homem é o Rei Salomão e a mulher uma plebeia pastora de ovelhas; na verdade, o sentido profundo dos poemas se referem ao amor entre Deus que é o grande Rei belíssimo e a alma apaixonada que personifica o povo de Deus.

As tendas de Cedar eram habitações rústicas, feitas de pele de cabras negras e utilizadas pelos nômades árabes do deserto pertencentes à tribos de Cedar. Ao comparar-se com estas tendas a amada do poema não está simplesmente referindo-se a uma característica física dela, mas nos dando uma mensagem sobre o homem exterior. Os pavilhões de Salomão são os belíssimos aposentos do palácio real e tratam acerca do homem interior.

Ao apresentar-se com estas duas características, a alma apaixonada parece apresentar uma contradição, mas que tem de ser entendida dentro da linguagem espiritual que significa este antagonismo entre o homem exterior e o homem interior. O apóstolo S. Paulo fala deste tema quando diz: “É por isso que não desfalecemos. Ainda que exteriormente se desconjunte nosso homem exterior, nosso interior renova-se de dia para dia.” (II Cor 4, 16). Estes tais homens exterior e interior são maneiras de falar a respeito de nossa realidade natural e sobrenatural, da nossa existência que se vê e está marcada pelas fraquezas da natureza e da nossa existência renascida na graça pelo Batismo e vivida no progresso da fé.

 

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Uma vez isto compreendido, então entendemos porque a amada do Cântico se apresenta como uma mulher morena do sol escaldante, o que a torna desgastada, não pela cor de sua pele, mas pela rústica vida à semelhança das feias cabanas de Cedar, e ao mesmo tempo ela se diz bela como os Pavilhões de Salomão, o que significa que interiormente ela é habitada pela graça de Deus. Novamente São Paulo nos ajuda a compreender isto quando diz: “Não sabeis que sois o Templo de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vós?” (I Cor 3, 16).

Este maravilhoso versículo, portanto, contém a mensagem de que nossa verdadeira beleza e grandeza está na vida interior e na habitação da graça, claro que isto não diminui os aspectos de nossa condição física, mas o homem exterior por sua vez não é o nosso corpo simplesmente, mas aquela parte de nós que está em luta contra a nova natureza, que insiste em desviar-se do caminho e em não ser dócil ao Espírito Santo. Nossa mente crítica e soberba que se inclina apenas para o sucesso material se desespera com o desconjuntamento de nossa natureza física, o que inevitavelmente ocorre até à morte quer sejamos cultos, belos, ricos, saudáveis ou não; todos seguimos por este caminho e por esta razão devemos despertar para nosso progresso em Cristo e fazer vencer o novo homem renascido na graça.

Deus não faz acepção de pessoas, todos aqueles, sejam quais forem, que invistam nos palácios reais da alma, serão plenamente habitados pelo Divino Rei, e o que era velho e rústico será desfeito para que a luz profunda do coração santificado brilhe dando testemunho da graça.

Abandone-se ao Espírito Santo, e Ele te fará um belo palácio real onde Deus habitará em plenitude, nas moradas mais interiores, na sétima morada onde está o trono de Deus.

 

SANDRO FATOBENE PERES – FUNDADOR DA COMUNIDADE FANUEL – ROSTO DE DEUS